Qual a diferença entre um "guru" explorador de satsangs e um mestre verdadeiro? Está nas palavras que diz ou naquilo que
faz? Uma boa oratória é sinal de elevação espiritual e moral? Será que palavras bonitas, doces e "sábias" indicam grande espiritualidade ? Leia o artigo abaixo e aprofunde-se mais nesta
importante questão.
Jesus,
certa vez, referiu-se aos escribas e fariseus dizendo:
“ na cadeira de Moisés estão sentados os
escribas e fariseus. Fazei tudo e guardai o que eles vos disserem, porém não os
imiteis nas suas obras; porque dizem e não fazem. (…) Amam o primeiro lugar nos
banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas, as saudações nas praças e
serem chamados de mestres pelos
homens” (MT 23:2-7).
Alguns espiritualistas não gostam de Jesus- não
sei porquê. Talvez por o acharem “demodê”. Talvez por não proferir apenas
palavras doces- como fazem alguns gurus contemporâneos – mas por dizer a
verdade. E a verdade nem sempre é agradável.Vale lembrar que Jesus
foi respeitado por grandes sábios, mestres e instrutores de vários tempos,
culturas e sociedades- incluindo Gurdjieff , Gandhi, Yogananda, Babaji,
Ramakrishna e o próprio Krishnamurti. Jesus não dizia nada para agradar ninguém.
Ele desmascarou a mentira, a falsidade e
a hipocrisia dos "mestres" do seu tempo.
É
importante ressaltar que quando Jesus fala
de hipocrisia, ele não se refere apenas a um contexto histórico específico . Ele
alerta sobre um traço característico do ser humano que extrapola espaço e tempo.
Tudo o que ele disse continua vivo, atual e verdadeiro . O ser humano de ontem
é o mesmo de hoje -os padrões se repetem. Mudam-se os costumes, o tempo, a
cultura e o país- mas o homem não muda. Continua o mesmo ao longo dos milênios.
Ora,
quem são os escribas e fariseus da época moderna? São todos os líderes
religiosos que roubam, enganam e exploram a fé do povo- de qualquer que seja a
religião, organização ou movimento . São aqueles que se passam por mestres
espirituais, mas exploram, enganam e iludem. Amam o dinheiro , o poder e a fama
– mais do que qualquer coisa. E, para alcançar isso, manipulam as mentes
fragilizadas, utilizando principalmente de um discurso bonito, sedutor e
comovente. Uma
retrospectiva básica mostra que todos os verdadeiros mestres não ficaram apenas nas
palavras. Antes de tudo tiveram uma vida condizente com o que pregavam.
Buda-
abandonou o palácio e a vida de luxo- e embrenhou-se na floresta em busca da
libertação. Ao encontrá-la, viveu uma vida equilíbrada e sóbria- sem nenhum tipo
de pompa, luxo ou regalia. Jesus-
o Mestre dos mestres- foi um simples carpinteiro. Não tinha “onde reclinar a
cabeça”. Em seu tempo havia muitos pregadores, salvadores e “profetas”- quase
todos fajutos. Qual foi o diferencial de Jesus? Com certeza não foi apenas suas
palavras- apesar de sábias, profundas e originais- mas sua vida de amor e
dedicação ao próximo e- principalmente- pelo seu sacrifício final. Coisa que
nenhum falso profeta teria coragem de fazer. Ou seja, Jesus não ficou apenas na palavra.
Foi além dela.
Ramana
Maharish abandonou cedo a casa dos pais para viver nos sótãos de um templo-
isolado, sozinho, sem dinheiro ou posses de espécie alguma. Lá não fez outra coisa
a não ser meditar ou “investigar” (vichara)- como ele dizia. Esta foi a primeira e última viagem que fizera . Depois
nunca mais viajou. Pra que viajar? Com que intenção? Pra
conseguir dinheiro e fama? Não. Isso não o interessava. Ele nada queria
e nada possuía. A única coisa que tinha era uma tanga pra cobrir as partes íntimas.
Não se sentia autoridade nenhuma e nunca
aceitou qualquer tratamento especial ou diferenciado. Era a imagem clássica do sanyasin- renunciante .Não teve família, nem trabalho, nem lar, nem posses. O
contrário do estilo de vida de alguns de seus supostos discípulos que hoje posam de “mestres”.
Krishnamurti nascera pobre, mas quis o destino que ele
tivesse uma vida diferenciada . Muito novo ainda, foi feito líder de uma
organização rica e poderosa . Mas, apesar de todo poder e bajulação, abdicou de
tudo isso, ao negar seu próprio messianismo e dissolver a famosa organização
que o idolatrava. Depois, passou a viver da venda dos seus livros, escolas e
doações. Esses recursos eram administrados pelas fundações que era formado por
um conselho de administradores. Durante um bom tempo, K. não quis se envolver
em assuntos administrativos. Depois de um problema com seu ex-secretário e
insistência de alguns amigos, K. aceitou fazer parte do conselho administrativo
das Fundações. K. costumava dizer que não possuía dinheiro e que nada precisava
além de um lugar pra dormir, roupas e alimento. As Fundações pagavam suas
despesas pessoais. Tornou-se exemplo de parcimônia, humildade e trabalho.
Lavava seu prato, lavava seu carro, aguava as plantas- sem regalias ou ares de mestre. Não
havia o menor traço de afetação, ou superioridade. Tinha uma vida confortável-
mas modesta- sem pompa ou ostentação.
Um
mestre não vive apenas de discursos- mas de atitudes e ações concretas. Falar
bonito é resultado do desenvolvimento de uma técnica: a da oratória. E isso
qualquer um pode fazer, basta que se dedique . Todos os oradores profissionais
conhecem os truques que tornam alguém “expert” na arte de falar. Essas técnicas incluem leituras, assistir bons
oradores, carisma, sagacidade, humor e inteligência emocional. Em última
instância, um bom orador, não passa de um hipnotizador. Ele pode ser o mestre
da oratória- mas isso não o torna um mestre espiritual.
Para
ser um bom orador -ou escritor – não é necessário aperfeiçoamento espiritual,
mas apenas de esforço e dedicação para desenvolver a arte de falar bem. O
espírito se aperfeiçoa através da vivência e da experiência- das dificuldades,
obstáculos e aprendizados diários. Os bons oradores tem poder de hipnotizar as
massas e, muitas vezes, usam este poder com fins políticos, militares ou
religiosos. Nada disso o torna um ser espiritualizado- pelo contrário- muitas
vezes serve apenas “pedra de tropeço”. A força da palavra levou pessoas como
Hitler, Jim Jones, David Kolesh e outros malucos ao poder - e à tragédia. Isso
prova que muitos psicopatas são ótimos oradores. Alguns se tornam gurus.
As
técnicas corretas de uso da palavra são estudados exaustivamente em várias
áreas, notadamente a hipnose, a teologia e o marketing. A palavra é o instrumento do
presdigitador, do malandro, do marqueteiro, do político, do hipnotizador e dos
auto-proclamados gurus. Todos eles aprendem a usar a palavra com finalidades
específicas. O problema é que muitos a usam para manipular pessoas com fins
puramente egoístas . Uma das técnicas
mais poderosas consiste em produzir emoções agradáveis nos ouvintes. Isso é
simples de entender: o cérebro funciona dentro do padrão: prazer e dor. Assim,
palavras positivas e confortadoras- criam emoções positivas e confortadoras. E
isso é confundido com paz,
bem-aventurança, graça etc. Mas está
longe de ser.
A
vida, as palavras, os pensamentos, as ações , emoções e sentimentos de um
mestre autêntico estão em completa sincronia. Tudo nele manifesta uma percepção
diferenciada. Isso não quer dizer que ele tenha que ser “financeiramente
pobre”- ou coisa parecida- mas suas atitudes caminham juntas com aquilo diz
e ensina . Lamentavelmente, alguns líderes
são tão sagazes que pregam exatamente o que não fazem e ainda tem a cara de pau
negar veementemente. Por exemplo: Nenhum
líder afirma que é mestre- mas tem um séquito de seguidores fiéis e fanáticos. Dizem
que não se importam com nada- com luxo ou dinheiro por exemplo- mas não abrem
mão de cobrar caros ingressos para os “satsangas” . Dizem que não exercem
autoridade- mas ai daquele que discordar do mestre – é “delicadamente”
reprovado pelo líder- ou outro babão qualquer. Dizem que não “prendem psicologicamente” ninguém,
mas se alguém quiser sair do grupo- perde a amizade e a consideração de todos-
inclusive do líder. Ou seja, há toda uma estratégia para fortalecer e manter a lavagem cerebral .
Por
fim, é importante relembrar as eternas palavras do mestre Jesus : “pelos frutos
conhecereis a árvore”. Mas, nesses de marqueteiros e bajuladores- está cada vez
mais difícil conferir se a árvore é boa ou má, pois a organização faz de tudo
para esconder ou negar os “frutos podres” . A imagem do líder é cuidadosamente
preservada de forma a nunca serem revelados seus defeitos, fragilidades e desmandos . Muitos crimes e escândalos de
alguns líderes espirituais são negados
até hoje pela organização exploradora- mesmo com todas evidências , provas
testemunhais, documentais e até registros em vídeos e fotos.
Tudo
isso nos leva a refletir sobre o poder sedutor da palavra, do discurso .Se a
palavra é a principal arma do hipócrita – é importante não se deixar levar por
discursos supostamente “profundos”- mas que no fundo não dizem nada. É fácil usar palavras bonitas, frases de
efeito e expressões rebuscadas- basta um pouco de treino , habilidade e cinismo.
O mais seguro- neste caso- é manter um certo distanciamento. Na dúvida- é
melhor não seguir ninguém. Faça como Jesus disse: “escutai-os, mas não os sigais,
não os imiteis, nem os chameis de mestre”. Lembre-se: o verdadeiro mestre não
precisa de auto-promoção, nem de marqueteiros, nem de explorar ninguém.
Basta-lhe uma vida digna, correta, honesta e harmoniosa. E ele demonstra isso não pelo que “diz ”, mas pelo que faz e vive.
Definitivamente,
a palavra não faz o mestre.
Pense
nisso!
Alsibar
http://alsibar.blogspot.com