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Krishnamurti: o joio e o trigo ( Alsibar) |
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Krishnamurti: edições Planeta |
Conheci Krishnamurti através dos livros. Quando seu corpo faleceu eu havia apenas
treze anos. Aos dezesseis, comprei um livro das Edições Planeta sobre ele. Este
foi o meu primeiro contato com aquele que iria tangenciar e influenciar toda
minha vida. Não senti nada de especial em sua aparência. Vi o rosto amarelado de
um homem , cabelos grisalhos, pele aparentemente branca, olhar vago e tristonho.
Não parecia indiano, mas europeu. Talvez por que, na época, a tecnologia de
impressão dos livros ainda era muito tosca. Mas como eu já havia comprado
outros livros da mesma coleção: Ramakrishna e Ramana Maharshi, resolvi comprar
este também. Ainda tenho o dito comigo. Velhinho, as pontas carcomidas pelas
traças e pelo tempo.
Sua mensagem, em princípio, não me tocou. Li o livro mas
quase nada ficou dele em mim. Talvez fosse muito profundo para minha mente
imatura. Todavia, percebi que ali estava alguém que compartilhava e confirmava
muitas das minhas opiniões. Primeiramente, fui lendo sua fascinante e intrigante biografia: um
menino pobre indiano que havia sido reconhecido como o novo messias, o novo
Instrutor do Mundo. Para isso o prepararam e o educaram. Mas… que surpresa não foi a minha, ao
perceber que, já adulto, ele havia rejeitado tal título, abdicando do seu status de messias. Vibrei com
a coragem, retidão e sabedoria de alguém tão jovem e desprovido de ambição.
Pensei… “e agora, Krishnamurti. Como viverás?”.
Mas ele pôs sua missão acima de qualquer
objetivo pessoal e perseverou até o fim . Só lhe importava uma coisa: “tornar o homem
absoluta e incondicionalmente livre”. Que importava os milhares de seguidores
com suas bajulações? A fama, o dinheiro e o poder? Refleti sobre mim mesmo e
minha própria condição. Lembrei-me dos homens da nossa sociedade. Muitos dariam
tudo para estar no lugar dele e regalar-se com tudo o que ele abandonou
espontaneamente.
Após saber da existência de Krishnamurti e sua mensagem,
passei a me interessar mais sobre ele. Nesse tempo eu já lia de tudo na área de
ocultismo e espiritualidade. Notadamente Bhagwan Shree Rajneesh ( Osho) e
Gurdjieff através de seu discípulo Ouspensky, além de Blavatsky, Trigueirinho e
outros. Mas o que eu mais apreciava nessa época era o guru Rajneesh. Gostava principalmente quando lia seus comentários sobre
Buda, Cristo e Krishnamurti. Neste ponto, o guru indiano era uma enciclopédia. Com ele conheci as principais correntes espiritualistas da época.E assim, vivi a
efervescência do movimento Rajneeshiano. Comprávamos os livros, jornais,
revistas, debatíamos sobre pontos discordantes, visitávamos centros de
meditação, presenciamos palestras, nutrimos o sonho de visitá-lo na Ìndia ou
nos Estados Unidos para onde , posteriormente, ele se mudou. Até que vieram os
escândalos, a queda, a prisão do “mestre”, a dissolução da comuna americana e, finalmente, sua morte misteriosa. Mas o tempo… ahhh o tempo… iria cuidar de separar o joio
do trigo.
Após todos esses acontecimentos, nos sentimos meio
órfãos. Mesmo assim, ainda continuava firme na leitura dos livros e palestras
de Osho. Quanto tempo durou a admiração e o encanto? Até quando aquelas palavras
bonitas e, até certo ponto, revolucionárias, satisfizeram minha mente inquieta
e insaciável? O tempo foi passando e com ele muita coisa virou cinza. Aos
poucos fomos aprendendo a diferenciar o que era bijuteria do que era ouro
puro. O que realmente tinha consistência daquilo que era
apenas produto enfeitado exposto no mercado da espiritualidade falaciosa. O que
é verdadeiro, profundo e essencial não falha nas horas mais difíceis, nem morre
com o tempo. Por isso Cristo, Buda , Krishna
e Babaji são eternos e Universais. E ao invés de morrerem, renascem e se fortalecem
com o tempo. Mas o que não tem essência, vai morrendo logo que passa a efervescência. Não foi o caso de Krishnamurti.
A mensagem de Krishnamurti se sobressaiu na minha vida,
não porque é bonita, fácil e confortadora. Mas porque esclareceu, iluminou e
me ajudou a compreender a mim mesmo e a minha vida. E isso não foi nada fácil.
Isso não me consolou, a princípio. Pelo contrário, dilacerou minha alma.
Destruiu minhas crenças, minhas ilusões e minha zona de conforto que eu zelosamente
tentava preservar. Sua mensagem – é verdade- como já disse um amigo blogueiro “
destruiu tudo e não me deixou nada”. Mas…
refletindo hoje: o que deixaria? E como poderia deixar? Tudo que era ilusão
tinha que ser demolido. E assim foi que os destroços acumulados de uma vida explodiram num
piscar de olhos. Desse meu cataclisma interior surgiu uma nova pessoa. Um novo
ser que não era, e não é seguidor de Krishnamurti. Nem de ninguém. Que
reconhece e sabe diferenciar ilusão da realidade. Que não busca, nem se satisfaz
com palavreados e discursos bonitos. Que não se apega a nada, nem a ninguém, nem
mesmo àquele que tanto contribuiu com o seu renascimento. Uma pessoa que não se
sente superior ou melhor do que ninguém. Mas que se sente livre e procura
ajudar àqueles que também querem sê-lo.
Gratidão… talvez essa seja a palavra que melhor expresse
meu sentimento em relação a Krishnamurti. Ele foi o coroamento de toda uma vida
de busca, pelejas, erros e ilusões. O que seria de mim e da minha vida hoje se não tivesse apreendido parte dos
seus ensinamentos que pra mim foram cruciais? Hoje sei que os
mestres existem. Não porque me disseram, ou porque eu li. Mas porque suas
mensagens de libertação e sabedoria afetaram significativamente a minha vida. Sei porque comprovo a veracidade e utilidade de suas palavras na minha vida
diária. Sei porque vejo os resultados concretos, mundanças positivas, em minha
vida e na vida dos que me rodeiam.
Sejam familiares, parentes e amigos –mesmo aqueles que vivem à
distância.
Sou profundamente grato a todos os mestres. Ressalto,
todavia, meu agradecimento especial à Krishnamurti a quem coube a difícil missão de revisar o
significado dos princípios fundamentais do Dharma ou Verdade Universal –há muito
esquecido, abandonado ou adulterado pelas intempéries do tempo e ação de
pessoas inescrupulosas. Krishnamurti, adaptou
a Verdade para a mentalidade do homem moderno , abrindo, assim, novos paradigmas
para a espiritualidade do Novo Milênio. Contudo, ele não abandonou o passado, mas reformulou-o,
revalidando e confirmando, assim, a essência
dos ensinamentos deixados por aqueles que vieram antes dele. Sei que muitos não
compreendem ou rejeitam a visão revolucionária de K. Mas é bom que
se reflita sobre a seguinte questão:
Os ensinamentos são universais e eternos, mas por causa
da dureza dos nossos corações sua essência se perde ao longo do tempo. Essa essência,
precisa ser relembrada, revitalizada e adaptada conforme a época , o contexto e
a cultura. Se não fosse seres como Buda, Jesus, Babaji, Krishnamurti dentre outros,
o ser humano estaria fadado a errar na escuridão e no sofrimento, perdido em
ensinamentos equivocados, ultrapassados e corroídos pelo tempo.
Muito Obrigado !
Alsibar
http://alsibar.blogspot.com