O papel do seguir e imitar na jornada espiritual |
Nos dias de hoje é comum vermos pessoas repetindo e imitando o estilo
dos mestres. Sejam pretensos gurus ou simples seguidores, o fenômeno da
imitação e do seguir é uma questão complexa e por demais importante. Antes de
Krishnamurti, o seguir e o imitar era tido como algo normal e até necessário. O
jovem indiano, no entanto, questionou a necessidade do seguir, tornando esse um
dos pontos principais de seu ensinamento. O artigo abaixo reflete sobre o seguir
e o imitar e até que ponto isso pode ser positivo ou negativo para o meditador.
Esperamos, com esta reflexão, contribuir para que cada um tire suas próprias
conclusões e forme sua própria opinião. Boa leitura!
Quando estamos aprendendo
uma profissão é normal imitarmos os mais experientes. Por exemplo, um escritor,
um cantor, um pintor, um lutador começam suas carreiras imitando o estilo
daqueles que os ensinaram e precederam. Somente depois de ter alcançado uma
certa maturidade e experiência é que partem para um estilo próprio imprimindo,
assim, sua marca pessoal ao trabalho. Será que o caminho espiritual também
segue o mesmo padrão? É correto
imitarmos os mestres e iluminados-mas até que ponto isto é salutar ? E quando
torna-se um obstáculo à evolução interior?
Jesus dos 13 aos 30 anos teria ele ido à Índia? |
Obviamente, todos que estão
aprendendo precisam de um certo
treinamento . É assim que as coisas funcionam –pelo menos neste plano de
existência. Quem nunca passou um período de intensa busca espiritual? Até mesmo
grandes mestres como Buda e Jesus – que certamente já eram espíritos evoluídos-
tiveram que passar por treinamentos, estudos e buscas. É famoso o mistério que
ronda , por exemplo, a vida de Jesus dos 13 aos 30 anos. O Evangelho nada fala
sobre este período desconhecido da vida do mestre nazareno. Muitos
pesquisadores afirmam que ele estava estudando e se preparando para sua futura
missão em escolas e mosteiros da Índia. Apesar de haver muitos indícios , não
há prova cabal sobre essa afirmação- mas é uma hipótese bastante plausível.
Buda, também, antes da Iluminação, estivera estudando os livros sagrados e
seguindo os famosos mestres espirituais da época. Todavia, teve que abandonar
tudo o que aprendera para seguir um caminho bastante pessoal. A questão é: será
que Sidarta Gautama teria conseguido influenciar tanto a humanidade caso não
houvesse seguido seu próprio caminho? Ou será que foi exatamente o espírito de
rebeldia e inovação que o tornou tão importante e singular?
Aqueles que mais se
destacaram na história espiritual da humanidade não seguiram ninguém. Melhor
dizendo seguiram a si mesmos - sua voz interna, sua intuição. Mesmo que isso
significasse ficar contra tudo e todos. Mesmo que isso significasse seguir
sozinho um caminho difícil e espinhoso. Krishnamurti e Ramana Maharish são
exemplos de “rebeldes espirituais”. Não tiveram modelos. Tiveram que ser seus
próprios modelos. Não tiveram mestres- a não ser Deus- que lhes falava ao
coração e os guiava. Descobriram, acima de tudo, que o caminho é algo muito
pessoal e próprio de cada um. Krishnamurti, por exemplo, é fruto de uma
história que é única e rara. Assim também foi a história de Yogananda e de
Ramana Maharish. Não há duas histórias iguais. Isto prova, mais uma vez, que a
Verdade, apesar de Universal, se manifesta a cada um de uma forma peculiar. E
nisto se encontra sua beleza e força. Daí vem a questão: até que ponto estamos
apenas imitando os mestres? Até onde esta imitação nos levará? Não seria mais
correto encontrarmos nossa própria “verdade” e nosso próprio caminho? Existe
coisa mais ridícula do que querer ser o que “não se é”?
Há certamente um período de
imitação compreensível e aceitável até certo ponto. Todavia, creio que chega um momento em que temos que encontrar a
nossa verdade e o nosso próprio caminho. Temos que ultrapassar o nível da “aceitação
e do seguir” para encontrarmos aquilo que nos identifica e nos torna únicos
dentro da história humana. Temos que aprender a separar as coisas: verdade,
fatos, crenças e supertições e construir nossa própria visão de mundo. Isso não
significa ser ingrato àqueles que nos precederam e nos guiaram. Os mestres são
nossos grandes referenciais e devemos a eles no mínimo nossa gratidão e
reconhecimento. Todavia, temos que nos tornar nossos próprios mestres, por
nosso próprio mérito e esforço.
Inri Cristo |
A jornada de cada um é
certamente única. Cada mestre teve uma história com contextos sócio-culturais
bastante específicos e diferentes. Uma pessoa nascida dentro do contexto e
cultura brasileira, não pode ter a mesma visão de alguém nascido na Índia-por
exemplo. Se o fizer soará falso, estranho e forçado. O Inri Cristo é um exemplo
exagerado disso- quer imitar Jesus em “quase” tudo, até mesmo no estilo das
roupas típicas da época. Algo patético, ridículo e absurdo. Até mesmo dentro de
um mesmo contexto sócio-cultural, será impossível que duas pessoas tenham a
mesma visão da Verdade. Babaji, Lahíri Mahasaya , Yogananda e Sri. Yuktéswar ,por
exemplo, viveram numa mesma época e comungaram de uma mesma cultura-todavia a
diferença de visão, compreensão e método entre os três é enorme. Fato este
ressaltado em várias passagens do livro pelo próprio Yogananda. Por exemplo: Yogananda
achava fundamental a fundação de organizações espirituais, já Lahiri Mahasaya
sempre se opôs a criação de tais organizações. Ele dizia “deixe que o aroma da
Yoga se espalhe naturalmente como o vento”. Sri. Yuktéswar tinha métodos bem
mais severos e rígidos em relação ao “treinamento” espiritual dos discípulos.
Já Yogananda era considerado muito mais amoroso e maleável com os mesmos.
Assim, conclui-se que é
impossível haver dois caminhos, duas visões iguais até mesmo entre pessoas de
um mesmo contexto cultural- imagina entre culturas, sociedades, costumes e
tempos absolutamente diferentes . O ideal de vida de Ramana Maharshi-um
saniasin renunciante- em nada se parece com o de Krishnamurti considerado um burguês pelo alto padrão de vida que levava. Nisargadata Maharaj, por exemplo,
comia carne e fumava, apesar de viver numa sociedade que tradicionalmente
reprova tais hábitos. Mais uma prova de que o caminho de cada um é algo muito pessoal
e íntimo.
A questão então, não é
seguir o ascetismo de Ramana, ou a vida regrada de Buda. Nem mesmo seguir os
hábitos carnívoros de Nisarga, ou a vida confortável de pequeno burguês de
Yogananda e Krishamurti. A questão principal é que cada um deve encontrar seu
próprio caminho e sua própria verdade. E esta será influenciada- por mais que
não se queira admitir- pela história de vida de cada um. Daí o erro de se
querer imitar e seguir à risca seja quem for. Daí a importância do não-seguir,
do não-obedecer, do não-acreditar.
A jornada de cada um é uma
obra de arte única e rara, resultado de diversas influência e fatores sociais,
genéticos e espirituais que faz você ser você. É essa a grande lição que a vida
nos dá através da diversidade de mestres com suas visões e vidas tão
diferentes. Mas aí está a beleza, a grandeza e o mistério da vida.
Parafraseando Lao Tsé no Tao-te-Ching: existe sim uma diversidade, mas misterioso
é o fundo de sua unidade .
A jornada espiritual é única e singular. |
Que possamos valorizar nosso
próprio caminho e percepção da verdade- pois ela não pode ser imitada, nem
repetida. Ela está exatamente onde você está e reflete o conjunto de suas
experiências e vivências. Nunca mais existirá um outro Jesus, nem um outro
Buda, nem Krishnamurti, nem Ramana. São todos produtos únicos e raros-
exatamente como você, eu e todo mundo. Querer ser igual a outro mestre é
semelhante a um cantor amador que pretenda se tornar, por exemplo, um outro
Elvis Presley, John Lennon, Michael Jackson ou outro cantor famoso qualquer-
simplesmente impossível. Todos nós somos produtos da história, do tempo e de uma variedade de fatores
genéticos, sociais, históricos, espirituais, cósmicos etc que nunca mais se
repetirão . Esses fatores em conjunto fizeram e fazem o homem- e não o contrário.
Um abraço a todos
meditadores e aprendizes!
Alsibar
http://alsibar.blogspot.com