Esse foi um diálogo que tive recentemente com o Juninho Alves sobre a
compreensão dos ensinos de Krishnamurti e sua relação com o advaita. Ao final
da conversa, percebemos que poderia dar um bom artigo para o blog para que mais
pessoas pudessem se beneficiar dos apontamentos feitos ao longo da conversa!
Juninho : Bom dia meu querido. Ontem eu recebi a notificação da tua Live e assisti uma parte. Teve uma fala sua que me lembrou muito quando eu lia Krishnamurti. A parte onde você afirmou que para que houvesse liberdade do sofrimento seria necessário "uma compreensão total, integral". Essa afirmação, tipo, me acendeu uma luz de alerta e pensei: “Para que eu tenha saúde física não é necessário que eu tenha uma compreensão total e integral da fisiologia e biologia do corpo humano, basta que eu não siga caminhos e atos que me tirem a saúde. Da mesma forma, para que eu esteja livre do sofrimento não é necessário uma compreensão total e integral dos mecanismos da mente, basta que eu não siga caminhos, atos e ações que me tirem a paz interior, isso me parece suficiente .
Alsibar : Bom dia Juninho! Muito boa sua questão. Se você já sabe, já conhece tais caminhos, realmente não precisa. Isso já demonstra por si mesmo uma grande sabedoria e autoconhecimento. Mas se a pessoa sofre, se ela está em conflito e dor psíquica, aí sim, ela vai precisar compreender como se meteu naquela situação e o que precisa fazer — ou não fazer — para se livrar dela. Ou seja: terá que compreender o mecanismo da mente que o LEVOU ao sofrimento., que a prende no sofrimento. Em tese, isso só vale para quem sofre e quer se libertar mas não sabe como fazê-lo. Quem não sofre, em geral, já tem uma espiritualidade natural, independente dos livros, mestres e conceitos. E ela é tão válida — ou mais até — do que aqela aprendida através dos livros e internet.
Juninho : Certo, correto. Vamos imaginar o seguinte: existe um pneumologista que tem uma compreensão total, integral, que por anos estudou a fundo os efeitos nocivos de fumar cigarro os efeitos nocivos nos pulmões e na saúde em geral e ainda assim ele continua fumando. Por outro lado, existe aquele que fumou algumas vezes, passou mal, ficou com dentes amarelados, boca cheirando a fumaça e decidiu parar de fumar para sempre. Qual deles fez a vontade do pai?
Alsibar : Ótima questão! É o seguinte: o saber do pneumologista é apenas teórico. Ele conhece tudo sobre os efeitos nocivos do fumo mas não sabe 'como' parar de fumar, uma vez q o vício já se instalou e dominou as células. Isso no campo Espiritual se chama carma: os efeitos e consequências de nossas ações. No caso, para que o pneumologista deixasse de ser apenas um erudito/cientista e se tornasse um sábio, ele teria que procurar uma saída para o seu problema. Talvez, pode ser necessário um verdadeiro milagre ou ação divina (graça), uma vez que o sistema neurológico/cerebral já deve estar bastante comprometido. Porque se o pneumologista pedir com sinceridade pela ajuda divina, ele pode libertar-se do vício sim. Eu mesmo conheço vários casos assim. Em suma é a mesma coisa que acontece quando os profissionais que tratam da ansiedade me procuram para ajudá-los a tratar de sua própria ansiedade. Obviamente, que só o conhecimento teórico que tiveram na academia não é o suficiente. É preciso um conhecimento mais profundo do mecanismo da mente humana. E é isso o que o Krishnamurti nos traz.
Juninho : Voltemos então a questão de " Ser ABSOLUTAMENTE necessário uma compreensão total, integral para haver liberdade do sofrimento psicológico" que Krishnamurti afirmou centenas de vezes em suas palestras e livros. Veja...
Alsibar: ... Não foi só JK, Buda e todos grandes mestres do autoconhecimento falaram sobre isso.
Juninho : ...A compreensão está na mente, é um produto da mente, fruto da mente, a compreensão é um movimento e uma ação que ocorre na mente. Quando eu deixo minha mente em paz, sem querer compreender nada, sem me preocupar com nada, sem inventar problemas psicológicos a serem resolvidos (essa tal compreensão total) descanso naturalmente na paz, sem necessidade de pensamento ou compreensão nenhuma.
Alsibar : Tudo isso que você disse é a compreensão do sofrimento. Ou seja, você entendeu como ele surge e como ele finda. Você compreendeu que quanto mais a mente se esforçar para compreender, menos ela compreenderá. Pois a compreensão não surge do esforço e sim do relaxar da mente.
Juninho : Pode ser, mas isso tem muito pouco a ver com uma compreensão intelectual ou mental, é mais um repouso nesse estado de paz.
Alsibar : Mas Krishnamurti nunca falou em “compreensão intelectual”. Não existe compreensão intelectual para JK. Para ele só existe a compreensão. E até pode existir, como algo inicial, superficial, mas não é a verdadeira compreensão que causa a mutação. Se bastasse a compreensão intelectual para a transformação seria muito fácil. Todo Krishnamurtiano seria iluminado pois eles compreendem JK “ intelectualmente” mas ficam presos nessa suposta compreensão. Eles têm dificuldade de entender esse repouso ou estado de paz resultante da compreensão dos movimentos mentais. Um intelecto muito ativo não consegue repousar, silenciar, sair de cena. JK repetiu inúmeras vezes: “uma mente ocupada é uma mente medíocre”. Um cérebro muito intelectual está sempre ocupado com seus próprios problemas, conceitos e ideias.
Então, vamos pegar seu próprio exemplo Juninho: para você entender tudo isso que você acabou de me passar, você ralou muuuuuito! Ou seja, como você iria saber disso tudo se não tivesse compreendido a si mesmo? Suas palavras são fruto de uma profunda compreensão do mecanismo mental causador do sofrimento. Do contrário não saberia. E é isso que quase ninguém entende em Krishnamurti: tudo que ele falou foi apenas para ajudar as pessoas a chegarem a esse ponto de compreensão que você chegou. Porque aí está o ponto em que a mente realmente para e se liberta de si mesma.
Juninho : Sabe essa foi mais uma das nossas conversas que poderia virar um artigo no blog. O curioso é que elas são parecidas nesse sentido: quando eu escuto uma frase solta de Krishnamurti e me vem a mente "isso não está de acordo com minha experiência ". Daí eu vou questionar você e você sempre me mostra uma coisa: que por mais que eu tenha estudado Krishnamurti por um longo tempo e com todo amor, carinho e atenção, eu não tinha a maturidade suficiente para entendê-lo na época, só depois de muito tempo, através da ajuda do Advaita de Ramana, essa semente espiritual de paz interior começou a germinar.
Alsibar : E eu fui o contrário: o Krishnamurti que me ajudou a entender melhor o Advaita Vedanta do Ramana.
Alsibar Paz e Juninho Alves
02/02/22
grato pelo compartilhar.2 queridos virtuais espelhos.
ResponderExcluirvida longa nesta paz.
paciência,a ciência da paz.
Obrigado pela participação Mauro.
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