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domingo, 29 de abril de 2012

SERÁ QUE A VIDA É UMA BRINCADEIRA?


Será que a vida é uma brincadeira? - Alsibar

Será mesmo que a vida é uma grande brincadeira? Por que será que os augus (autoproclamados gurus) repetem tanto esta frase? A quem interessa essa ideia e quem lucra com ela? O que dizem os verdadeiros mestres sobre isso? Será que o prazer é a mesma coisa que a Felicidade ou Bem- Aventurança citada pelos verdadeiros sábios? Vamos pensar um pouco?

É comum ouvirmos por aí  a frase de que a vida é uma grande brincadeira.  Em geral são repetidas à exaustão pelos autoproclamados gurus para mandar uma mensagem subliminar à mente de suas vítimas e ainda seduzir os possíveis neófitos. Tal imagem toca fundo no inconsciente coletivo de todos nós . Isso nos deixa emocionalmente vulneráreis. A ideia implícita é muito simples. Primeiro, quem não gosta de brincar? Brincar nos remete aos melhores e inesquecíveis dias de nossas vidas. Quando éramos crianças e tudo parecia belo, lindo e perfeito. Em fração de segundos, a mente ingênua, fraca e despreparada faz o seguinte cálculo: “minha vida está uma droga, cheia de responsabilidades, problemas e dores. Quero sentir isso  e tornar minha vida uma grande brincadeira, cheia de prazer e alegria.”

Qual o problema em se buscar prazer e alegria? Em princípio nenhum. Mas quando se erige uma autoridade espiritual tendo como fundamento a promessa de sensações de prazerosas, ficamos escravos das sensações, dos métodos e dos gurus. É preciso ter maturidade pra se saber que a vida não é só prazer e alegria. Ela é também prazer e alegria. Buda, quando se iluminou, compreendeu a verdade acerca da vida. Disse ele que viver é estar sujeito à dor. Será que ele estava errado? Reflitamos: existirá alguém na face da terra que conseguiu ou conseguirá se libertar da doença, da morte, da velhice e da dor? É possível que haja uma alegria que seja eterna e permanente? Ou será que essa conversa não é apenas mais uma armadilha fabricada pelos gurus para seduzir novos adeptos?

Há ainda outras questões envolvidas. Os exploradores adoram dizer que tudo é uma brincadeira. Mas, fico refletindo: será que a vítima do engodo acha isso também? Isso deve ser divertido para quem comete o delito, não para a vítima. O sedutor e psicopata que engana mulheres para roubar-lhes dinheiro, certamente acha que tudo é "uma brincadeira". Ele é incapaz de sentir a dor do outro então, para ele, tudo é uma grande diversão. Mas e a vítima? Será brincadeira pra ela? Haverá graça na desgraça do outro? Penso que não, afinal, ninguém gosta de ser explorado ou enganado.

Dizer que a vida é uma grande brincadeira nada mais é do que "tapar o sol com a peneira". A vida simplesmente é. É o que é. Seja o que for. Se colocamos um rótulo na vida, como sendo, ou como não sendo uma brincadeira iremos, certamente, nos distanciarmos da verdade. Há obviamente muita coisa boa na vida. Mas não podemos nos esquecer dos seus perigos e ilusões. Enquanto existir  as drogas, a violência, as injustiças sociais, as fraudes, as mentiras, os roubos, as ilusões e tudo que causa a dor e o sofrimento, não podemos sair por aí ensinando às pessoas que tudo é brincadeira. Só sabe a intensidade do sofrimento, quem por ele passa. Se o sofrimento é resultado de uma brincadeira cósmica,  esta é de muito mau gosto e eu me recuso a fazer parte dela.

Mas a verdade é que a vida é algo muito sério. Quem não leva a vida a sério, considerando-a uma grande brincadeira está fadado à frustração e sofrimento. Ser sério não é o mesmo que ser carrancudo e de semblante fechado. Nem quer dizer que a pessoa não possa sorrir e brincar. A vida é alegria e dor, felicidade e infelicidade. Ela é  dual. Há momentos de bem-aventurança e também de tristeza e dor.  Ninguém escapa desta realidade. Por isso é um erro sair por aí pregando e afirmando que tudo é uma brincadeira. Muitos gurus fizeram isso no passado e o que colheram? Desgraça, vazio e desilusão. Se tudo é uma grande brincadeira, por que haveremos de buscar a libertação? Isso me lembra o filme Matrix. Se achamos que estamos livres e que tudo é uma  maravilhosa brincadeira, então continuaremos sendo escravos da Máquina da Ilusão. A  Matrix vende a falsa ideia de que tudo é felicidade apenas como um artifício para distrair as pessoas, evitando que elas possam buscar o despertar e a  libertação.

Mas, há certamente um caminho que conduz à libertação do sofrimento. Ele não é fácil de se trilhar. Mas ele existe. Através da Meditação e do Autoconhecimento o homem encontra este caminho e descobre que enquanto houver alguém, uma entidade buscando o prazer e rejeitando a dor- haverá sofrimento. Há um estado além da dualidade prazer-dor. Mas ele não pode ser alcançado através da ilusão da busca,  pois a própria entidade que busca é ilusória. Além do mais, não existem atalhos. Grandes mestres despertos como Buda , Krishnamurti, Lahiri Mahasaya, Sri Yuktéswar, Paramahansa Yogananda, Ramakrishna e Ramana Maharish passaram uma vida dedicada à meditação. Por isso não acredite em promessas baratas. Não seja mais uma vítima de pessoas mal intencionadas que prometem o céu fácil. A história nos mostra que os gurus exploradores, sempre apelaram a este argumento para seduzir e iludir as pessoas. O país das maravilhas só existe nos filmes e nos sonhos. Quem envereda por essa fantasia, quando acordar, poderá ser tarde demais.

Cuidado com  aqueles que querem te vender o prazer como sendo a essência da vida. Isso é uma visão hedonista e perigosa. Nenhum mestre verdadeiro, nenhum iluminado verdadeiro pregou algo parecido. A Felicidade, Bem-Aventurança ou Nirvana falada pelos grandes mestres como sendo a essência do Ser, não é a mesma coisa que prazer.  É um estado além das palavras e da dualidade, que a mente-pensamento não pode conhecer, nem experimentar.  Assim, confundir a Bem-aventurança com uma alegria transitória, originária de um pensamento, crença ou ideia, não passa de uma grande ilusão. Sariputra, discípulo direto de Buda disse certa vez a Udayil:

“- Amigo, Nirvana é Felicidade.
- Mas, amigo Sariputra, que felicidade pode ser se não há sensação?
- Não tendo sensação- isso mesmo que é felicidade.
Nirvana não é uma condição negativa ou positiva. As noções de “negativo” ou positivo são relativas e pertencem ao domínio da dualidade. O Nirvana está além do pensamento da dualidade e relatividade; portanto, está fora das nossas concepções de bem e mal, do justo e injusto, da existência e não-existência. Mesmo a palavra "felicidade", usada para descrever o Nirvana, tem um sentido completamente diferente[1]

Achar que a vida é uma grande brincadeira poderá sair caro demais. Se a vida é uma grande brincadeira, só pode ser de muito mau gosto e perigosa. Além do mais, se todo sofrimento que ocorre no mundo é uma grande “brincadeira divina”, então Deus é um tremendo masoquista. E eu me recuso a pensar no Absoluto como sendo uma força que se compraz e se diverte com o sofrimento humano. 
       O aviso está dado. Não reclame depois, dizendo que não sabia e que ninguém lhe avisou. Lembre-se do que disse Jesus, o Mestre dos Mestres:
     "Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta, e espaçoso o caminho que leva à perdição, e muitos são os que entram por ela. Que estreita é a porta, e que apertado o caminho que leva para a vida, e que poucos são os que acertam com ela"( Mateus, VII: 13 e 14).
Namastê!
Alsibar
http://alsibar.blogspot.com


[1]  Budismo Psicologia do Autoconhecimento: George da Silva e Rita Homenko