O Guru e o Meditador- imagem da Internet |
Será realmente necessário termos um guru ?
Quais os limites da atuação de um guru e como eles podem nos ajudar? Qual deve
ser a qualidade da relação guru-discípulo? Quais os riscos de se ter um guru
como autoridade espiritual? Quem são os verdadeiros gurus e como eles atuam?
Vamos refletir e descobrir juntos?
O termo “ guru”, mestre espiritual, vem do
sânscrito e significa , dentre outras coisas, “aquele que detém a luz do conhecimento”.
Na Índia, os gurus gozam de grande respeito e veneração por parte da população. Isso deve-se a fatores culturais e
religiosos próprios daquela região. É sabido que existem gurus verdadeiros e verdadeiros charlatães. Os verdadeiros mestres são seres de consciência espiritual tão
elevadas e raras, que chamá-los de gurus tornou-se pejorativo. O título, usado
livremente por qualquer “guru de araque” como forma de exploração e
auto-promoção, tornou-se motivo de paródias e críticas. Os maiores culpados disso tudo são os próprios "gurus". Via de regra, eles têm seu nome envolvido em escândalos que vão desde a pedofilia,
enriquecimento ilícito, até assassinatos e mortes. Assim como
na tradição ocidental cristã, os pastores, padres,
médiuns etc protagonizam esses tipos de escândalos, na Índia, os tais "gurus" estão o centro de tais aberrações.
É difícil existir um meditador que não tenha desejado encontrar um guru. Na
Internet temos a facilidade de escolhê-lo com um simples “clique”. São centenas
de milhares para todo tipo de gosto e bolso. Só na Índia, existem centenas deles. Nos Estados Unidos e Europa, idem. Os brasileiros não precisam mais viajar para Índia para encontrá-los. Já temos tanto gurus, que estamos exportando para o exterior. Já podemos presenciar, inclusive, disputas e brigas entre eles no ambiente virtual . A grande questão que se impõe nessa
floresta de confusões, brigas e satsangs é : será
mesmo que precisamos dos gurus? E
quais os riscos desta relação polêmica e confusa? É o que vamos analisar adiante.
Os riscos são muitos. O guru, em geral,
considera-se uma autoridade espiritual que pode transmitir-lhe a Verdade, a
Luz, a Libertação etc. O problema é que, em muitos casos, eles tornam-se
mercadores dessa mesma Verdade que professam. Recententemente, vi um caso na Internet em que um
guru- desses brasileiros famosos- convidava as pessoas para ajudar na
construção de um novo “salão”. Até aí tudo bem. Todos nós podemos
contribuir com um trabalho sócio-espiritual. Todavia, no site dizia que para
trabalhar lá você tinha que contribuir financeiramente. E a quantia era razoável. Vou repetir para quem não entendeu: você tinha que pagar pra trabalhar! Como pode isso? Ou seja, a
própria ajuda, teria que ser paga. Eles conseguiram transformar algo tão puro e sublime como a "ajuda", em uma espécie de “mercadoria”. Fico imaginando a
cena, de algum pedreiro ou servente pobre tentando “ajudar”, com seu trabalho na
obra :
- Vim para ajudar na construção do salão.
- Ok, o preço é 100, 00!
- Mas como???? Sou eu que vou trabalhar ! Vocês é que deveriam me pagar. Além do mais minha força de trabalho e
experiência são mais valiosos do que dinheiro e vocês ainda querem que eu pague
por isso?
- Aqui é assim, pra ajudar com seu trabalho, você tem que
pagar!!!!
Obviamente que quando um guru chega a este
ponto é porque ele já está no topo da fama. Deve ter tanta gente disposta a
pagar para trabalhar, que ele não faz questão de nenhuma ajuda sincera e
verdadeira. A que ponto do absurdo chegamos? Coitada da viúva dos Evangelhos,
iria sentir vergonha de seus parcos vinténs. E Krishna, neste sentido, parece
agir tolamente quando diz que recebe de bom grado todas as oferendas oferecidas
de coração , mesmo que seja uma simples flor ou um pedaço de pão.
Mas, em geral, os gurus são espertíssimos.
Enquanto estão no púlpito, sua linguagem é impecável. Seus discursos são
capazes de levar ao êxtase, de tão belos, profundos e poéticos. Aos olhos dos
discípulos, encenam o “tipo” que tão esmeradamente tentam encarnar: a do guia
espiritual autêntico. Mas, na vida privada, revelam sua verdadeira face cheia
de defeitos, desejos, rancores e ambições como qualquer outro ser humano.
Quando iniciam sua jornada em direção ao tão sonhado sucesso, evitam assuntos
polêmicos , mostram-se tolerantes e amorosos para com tudo e com todos. Na falta de um ensinamento mais original, falam exaustivamente sobre Amor. Nenhum tema é mais universal e cativante do que este. Todavia, quando se estabelecem no sucesso, mudam radicalmente. De forma sutil e sorrateira, tornam-se autoritários,
antidemocráticos e intolerantes com qualquer um que “ameace” os seus domínios. Todavia, muitos são covardes e agem na surdina. Em geral, escolhem algum
tipo de “secretário particular” pra fazer o trabalho “sujo”. A estratégia é a
seguinte: quando são questionados sobre o estabelecimento de alguma ordem
polêmica -que geram críticas ou problemas - atribuem isso aos exageros do “secretário”- nunca a si mesmo. Osho
(Bhagwan Shree Rajneesh) o mais famoso dos gurus, usava desta estratégia com
sua famosa secretária Sheela- a quem, quando convinha, atribuía todos os
mal-feitos e atrocidades cometidos em seu nome. Nunca assumia a culpa de nada.
Apenas quando era estritamente conveniente.
Ou seja,
nesse mar de lama, o meditador deve ter muito, muito cuidado e atenção. Outro
fato muito comum que ocorre nesses movimentos é que o meditador passa a ficar tão envolvido com os negócios do movimento, que esquece o verdadeiro sentido dele está ali.
Ou seja, a libertação interior e a meditação passam para segundo plano. Em primeiro lugar vem o trabalho “missionário” de divulgação, estabelecimento e
fortalecimento da obra, do nome e da vida do guru. Isso demanda tempo, trabalho
e energia. À essa altura, caso o
meditador se questione o porquê de ter que trabalhar tanto, sem tempo para
dedicar-se ao seu próprio desenvolvimento interno, o guru ou algum superior imediato lhe
responde categoricamente:
- Servir à causa é sua meditação. Trabalhar
pela causa do mestre, divulgando seu nome e sua obra é o maior dos exercícios
espirituais.
E fica por isso mesmo. A verdade passa a ser,
não a “Verdade” , libertadora, universal, além do tempo ou espaço. Mas a
verdade professada pelo guru e, de preferência, exclusivamente ela. Morre então
todo o sentido de busca real. Aos poucos perde-se a capacidade de compreender,
refletir, criticar e indignar-se. Neste ponto, o meditador que, em princípio
procurou o guru e o movimento como forma de evoluir interiormente, é reduzido a
uma espécie de robô, um zumbi. Perde totalmente a vontade própria e a capacidade de refletir. Sua vida está
entregue totalmente aos pés do guru e a desgraça o acompanhará como uma nefasta
sombra.
Os verdadeiros e raríssimos gurus existem.
Mas encontrá-los fisicamente é tão raro quanto encontrar um diamante azul.
Todavia, eles existem. Em geral, vivem
no anonimato e somente os buscadores sinceros e espiritualmente elevados podem
reconhecê-los. Esse foi o grande mérito de Yogananda. Antes dele, muitos
escritores, pesquisadores e curiosos haviam ido a ìndia à procura dos grandes
iogue -sem sucesso. Achava-se, inclusive, que não mais existiam. Então por que
Yogananda conseguiu encontrar tantos iogues fabulosos? É simples: porque ele próprio era
um grande iogue. E somente um iogue pode reconhecer outro iogue. Os grandes
mestres, ao contrário dos augus (autoproclamados gurus), se escondem dos
holofotes, não viajam para dar “satsangs”, evitam a publicidade e não cobram
por seus serviços. Na época de Yogananda
havia vários grandes iogues no anonimato. Raríssimas pessoas reconheceram, por
exemplo, Sri Yuktéswar como um grande iogue. E até mesmo o fantástico Babaji,
aparecia frequentemente entre as pessoas comuns, sem chamar atenção.
A única exceção a esta regra, são os
iluminados com missões importantes, tais como Buda, Jesus e Krishnamurti. Eles seguem uma ordem interna
que os impele a agir publicamente devido ao cumprimento de importantes funções no mundo. São missões fundamentais para o
desenvolvimento da consciência humana. No caso deles , foi necessário que
saíssem do anonimato e assumissem uma vida pública atuante, do contrário, não
poderiam desempenhar o papel histórico que o destino lhes conferiu.
No caso de Krishnamurti, foi mais difícil ainda, pois ele teve sua vida
escancarada na mídia desde muito cedo. Mas, como ele veio com uma missão importante específica, entende-se o porquê de tanta visibilidade. Era necessário, que o máximo de pessoas pudessem ter acesso ao seus ensinamentos, pois ele iniciou uma nova era no desenvolvimento da espiritualidade humana.
Apesar dos acima citados fugirem à regra pelas razões já expostas, os verdadeiros mestres, geralmente, são inacessíveis e anônimos. Desconfie dos gurus que vendem caminhos
fáceis pela Internet. Em geral, são apenas exploradores. Alguns são
“esquizofrêncos” pois se consideram a encarnação de alguma entidade
divina. É mais seguro evitá-los. Mas caso você os escute, escute-os mas não os siga, respeite-os mas não
os venere. Reflita sobre a sabedoria da Bíblia: “aprendei de tudo e retei o
bem”. Os gurus, por mais elevados que sejam, não podem lhe dar o céu, a verdade
ou a libertação. Eles apenas esclarecem, explicam, apontam o caminho. Todo o
“trabalho pesado” deve ser feito por você e somente por você. E qual é este
trabalho? Meditar, meditar e meditar. Gurdjieff costumava dizer que o nível do guru
é proporcional ao nível do discípulo. Ou seja, mesmo que alguém se encontrasse
com mestres como Babaji, Jesus e
Krishnamurti não seriam capazes de seguir seus ensinamentos. Como de fato
ocorreu com os milhares de ouvintes de Krishnamurti. Por não o compreenderem,
ou não conseguirem viver seus ensinamentos, muitos preferiram procurar outros
gurus mais “baratos” e práticas mais “fáceis”.
Da mesma forma muitos que iam visitar Sri. Yuktéswar, o abandonavam logo
depois, ao constatarem o elevado nível de seus ensinamentos e sua própria incapacidade
para cumpri-los.
Portanto, não se lamente por não ter um guru.
Buda, Jesus, Ramana e Krishnamurti não tiveram gurus e , no entanto, foram
grandes iluminados. Os verdadeiros gurus atuam no plano invisível de forma
anônima e silenciosa. Eles não precisam fazer “satsangs” ou viajar fisicamente
para se encontrar com as pessoas. Onde quer que haja um meditador sincero,
haverá a assistência dos verdadeiros mestres da luz. E o melhor: de graça! Esteja aberto ao aprendizado, e as lições surgirão de todas as fontes. Sejam
dos livros, dos mestres, dos “augus”, dos familiares , amigos, professores e
pessoas ao seu redor. Todos eles nos ensinam algo. Procure manter sua mente
aberta e alerta. As grandes lições da vida podem vir de onde menos se espera.
Se estiveres pronto, o mestre aparecerá com certeza. O irônico é que, quando
estamos prontos, não precisamos mais de mestres, pois passamos a vê-lo em todos
os lugares, pessoas e coisas- inclusive em nós mesmos.
Namastê!
Alsibar
"Mestres" e "gurus" surgem porque as pessoas não se aguentam. O próprio estar em si torna-se insuportável. Mais fácil procurar um "experto" em iluminação,ouvir ordens e fazer exercícios... Aí a compensação: Torno-me um "iniciado", um "shaumbra", um "discípulo", agora EU SOU especial,diferente dos "profanos" ... E nunca estaremos aqui sendo o que somos, para começar,sempre buscaremos a sombra da fama alheia. Dormimos. Grande artigo!!!
ResponderExcluirObrigado amigo Nestor... seus comentários enriquecem o tema e motivam-me nesse empreendimento espinhoso de "sacudir" as pessoas. Namaskar!!!!
ResponderExcluirContinue "sacudindo " as pessoas !
ResponderExcluirObrigada que nos transmitiu aqui em Aracati !
cara, o erro é "preciso". como navegar. estamos num patamar que exige erros, precisamos da porrada que vem em seguida. Erramos. Somos Errantes. Não temos gurus, instituições, religiões, somos Ronins. trazemos o poder (inerente a todos), mas configuramos dia a dia esta consciência que canalizará o poder - a Consciência é o "Corpo do poder". saber voltar do erro é mais sábio do que acertar. Saber voltar ao Porto Seguro da Consciência é sublime. FraterAbraços!!!
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