Krishnamurti foi um fenômeno único na história da
espiritualidade humana. Enquanto sobre Cristo e Buda quase não há registros confiáveis e fidedignos,
sobre Krishnamurti- um iluminado moderno- não faltam registros de toda sua vida, desde a infância até a idade avançada tudo foi
gravado e documentado, suas milhares de palestras, diálogos, seu
dia-a-dia, suas viagens, seus êxtases , sua própria mente, seus relacionamentos e até
sua vida íntima. Como se não bastasse uma biografia singularíssima, some-se a
isso uma mensagem única e revolucionária, no conteúdo , na abordagem,
na linguagem e até no novo sentido que deu à própria palavra “ensinamento”. Há
vídeos em que JK diz não ter ensinamentos. Mesmo assim, pouco antes de morrer, ele cita a importância fundamental de se vivê-los. A aparente contradição é
explicada pelo fato de que o sentido da palavra
“ensinamento” tinha, para ele, uma
conotação diferente .
No passado, o
hábito de memorizar e repetir as palavras e as histórias dos grandes mestres
teve sua importância. Antes de serem escritos,
os ensinamentos eram memorizados e repetidos.Tanto no Budismo, no Cristianismo,
quanto no Hinduísmo, a tradição oral foi fundamental para a preservação de parte da mensagem dos sábios do
passado . Todavia, com a chegada de invenções como a imprensa, o gravador e o vídeo-cassete, que registravam e preservavam
os acontecimentos , a repetição não se fez mais necessária. Hoje em dia, com a
informatização e a chegada da Internet , qualquer pessoa pode ter acesso a
vídeos , áudios e documentos que retratam fielmente as palavras e a vida de figuras importantes do mundo
moderno.
O problema é que a
mente humana passou tanto tempo valorizando a memorização como forma ideal de
aprendizagem que tornou-se viciada nela.
A questão é que este artifício se tornou desnecessário e até um impedimento à
compreensão. É tanto que , no começo, Krishnamurti
costumava advertir as pessoas para não tomarem notas. Sua intenção era que elas
aprendessem uma nova forma de aprender: através da captação imediata do sentido daquilo que
estava sendo transmitido. E, para isso, seria necessário um tipo de atenção especial que o “tomar notas”
certamente atrapalharia .
No universo krishnamurtiano, a memorização não ajuda- pelo contrário- atrapalha. O caminho do aprendizado apontado por
Krishnamurti é a investigação atenta, séria , sincera, honesta e livre do
passado, ou seja, o contrário da memorização. Nessa nova maneira de aprender
não há espaço para citações vazias, repetições mecânicas, memorizações ineficazes e informações de
segunda mão. JK não deixou espaço para a mente se apoderar, manipular e
distorcer suas palavras . Infelizmente,
muitas pessoas não estão acostumadas com essa forma inovadora de aprendizado.
Ora, como a mente fora acostumada ao longo de séculos a
receber tudo pronto e mastigado ela se tornou preguiçosa . As tradições,
religiões e gurus não ensinaram as
pessoas a investigarem e compreenderem as coisas por si mesmas. Por muito
tempo, elas foram ensinadas a aceitarem
aquilo que lhes era repassado- sem questionamentos, nem nenhum esforço cognitivo especial . E o
resultado foi que a mente tornou-se obtusa, incapaz de penetração, investigação e
apreensão . O que Krishnamurti tentou ao longo de toda sua vida foi despertar
nas pessoas a confiança de que elas
mesmas poderiam ter acesso à Verdade independente dos livros, gurus, líderes, tradições e religiões –enfim- do
conhecimento acumulado do passado.
Infelizmente, por incapacidade ou até má fé, muita gente tem
memorizado o conhecimento repassado por Krishnamurti, fruto de sua percepção
direta daquilo que estava sendo por ele investigado,
e tem usado isso não como um meio de libertação mas como mais um fardo para a mente já entulhada de conhecimentos . É essa
repetição memorizada das palavras e ensinamentos de Krishnamurti que faz nascer
o tal do “krishnamurtiano”. Aquele
sujeito que tenta “seguir” seus ensinamentos não através da vivência mas através
da memorização, como se estes pudessem ter o mesmo tratamento que os religiosos
tradicionais dão às palavras de Cristo, Buda e Krishna- por exemplo. Para
Krishnamurti, suas palavras não deviam
ser memorizadas mas percebidas como uma realidade na própria pessoa e pela própria pessoa. Ele
era apenas uma espécie de espelho. Sendo assim, não há compreensão de
Krishnamurti sem que haja conhecimento de si mesmo- essas duas instâncias são
indissociáveis.
Algumas pessoas me acusam de interpretar os ensinamentos de Krishnamurti através dos
meus artigos e vídeos. Eu não seria maluco de fazer uma coisa dessas- além de ser
uma grande estupidez. Krishnamurti não precisa de interpretes . Além disso, há
centenas de livros, vídeos e áudios para quem quiser acessá-los de forma direta. Mas, exatamente por não ser um
“krishnamurtiano” é que sou livre para fazer meu próprio caminho sem precisar
obedecê-lo, afinal, não sou seu discípulo. Mas, ao falar sobre Krishnamurti e
seus ensinamentos, procuro mostrar que a Verdade daquilo que ele apontou está
acessível a todos. Krishnamurti é como um astrônomo que usa um telescópio para
lhe mostrar as estrelas: ele aponta o que viu
e você também poderá ver se tiver
o equipamento correto e olhar na direção correta. Se você as vir, então você
se habilitará a falar por conta própria sobre elas- antes disso não.
Sim, o que Krishnamurti ensinou não pode
ser repetido- a não ser que você mesmo tenha compreendido e então aquela
compreensão passa a ser parte da sua própria experiência pessoal. Do contrário, será alguém falando sobre algo que
nunca viu, nem experimentou- o que não tem validade nenhuma.
Krishnamurti apontou
a existência de um estado sublime dentro do próprio homem. Repetir o que ele
falou, sem ter encontrado tal estado, nada mais é do que se auto enganar e
enganar os outros. Eu passei mais de trinta anos estudando, pesquisando e
investigando em mim mesmo aquilo que JK ensinou, e se cheguei a alguma
compreensão real- não foi por mérito meu- repito- não foi mérito meu. E estou
dizendo isso apenas como forma de motivá-lo, não para engrandecimento próprio
pois me lembro de mim mesmo, de minha luta e sofrimento e o quanto muitas vezes
eu quis desistir dessa jornada interior em direção à verdadeira libertação.
Meus artigos e vídeos querem apenas mostra a você que a Liberdade está
acessível a todos- e não apenas a raríssimos escolhidos.
Para terminar, quero dizer que você deve continuar sua busca pela compreensão das verdades que ele
apontou até que você as compreenda também e
isso torne-se parte de você. Substituir a investigação e a compreensão por memorização e repetição é
assinar um certificado de incapacidade cognitiva e pobreza espiritual. Por isso, não ceda à tentação de tornar-se um
mero repetidor da mensagem libertadora de JK. Viva-a! Experimente-a! Não seja apenas mais um “krishnamurtiano” dentre tantos
outros que existem por aí!
By Alsibar