Hoje é dia de Corpus Christi, por coincidência, ontem vi uma postagem no
Facebook sobre a supracitada máxima de Jesus. Resolvi me posicionar no
post e isso gerou uma série de controvérsias e comentários. Felizmente, a conversa se revelou muito frutífera no final: além de fazer novos amigos, pediram-me autorização pra usar o diálogo em
um grupo de estudos- o que foi uma honra pra mim . Hoje cedinho, durante minha
caminhada meditativa, me veio uma grande vontade de escrever
alguns artigos sobre as máximas mais “intrigantes” de Jesus com o intuito de
ajudar aqueles que sinceramente buscam entender
melhor as misteriosas palavras do Mestre Nazareno. Boa leitura e aprendizado!
“ Mas
àquele a quem muito foi dado , muito lhe será exigido; e àquele
a quem muito se confia, muito mais lhe pedirão” (Lucas 12:48)
Essa afirmação foi dita por Jesus
Cristo no final da parábola do Servo Vigilante e considero-a uma das frases mais verdadeiras, profundas e intrigantes que eu já tive a oportunidade de ler. Pra entendê-la melhor, é necessário compreender
uma peculiaridade da parábola: ela tem vários níveis de entendimento e
compreensão.
Em um nível mais superficial, fica-se
com a impressão de que Deus é uma espécie de Senhor exigente , durão e
carrasco. Esse tipo de compreensão superficial atende à mentalidade mediana das
massas em geral. Eles entenderão que Deus exige vigilância constante dos seus
servos em relação à obediência dos seus preceitos e ensinamentos- do contrário
poderão ser “pegos” de surpresa, numa morte súbita ou na vinda repentina do
Apocalipse. Nesse nível de compreensão, o medo funciona como freio de más
condutas e negligência. Há pessoas que só entendem a linguagem do
medo, precisam dele como freio para impor-lhes os devidos limites.
Todavia, em um nível mais profundo a
parábola revela outras nuances e significados que dispensam o medo. É ai que
percebe-se: Jesus não está falando de
coisas materiais, nem mesmo de regras de conduta moral ou religiosa- mas sim de
vigilância no sentido da meditação que
leva ao conhecimento e faz surgir a sabedoria. A parábola usa termos como Vigilância , Conhecimento , Saber...
constituindo, portanto, as chaves que revelam o sentido oculto e mais profundo
da mesma.
Os servos relapsos e imprudentes são
todos aqueles que conhecem a Verdade sobre si mesmas ou sobre o Universo-
independente de religião- mas não a vive, nem se beneficiam dela. Os servos
prudentes são todos aqueles que empreenderam a viagem interior através da
oração e da meditação ( Orai e Vigiai) e lá encontraram o Reino de Deus ,
podendo, assim, usufruir de uma vida plena e abundante pelo conhecimento da
Verdade. Quando ele diz no final: "a quem mais foi dado, muito lhe será
exigido" Ele está falando do verdadeiro conhecimento, da consciência, do
autoconhecimento. Em outras palavras : aquele que tem mais conhecimento, maior
é o seu dever e sua responsabilidade para consigo mesmo- sua própria
consciência iluminada- e para com os demais.
Obviamente, aquele que tem menos
conhecimento- de si mesmo, das leis da natureza, de Deus etc etc... - Não se pode
exigir muito. Por exemplo, uma pessoa criada em um meio religioso de valores e
regras ultrapassadas ou absurdas- que não teve chances de conhecer outros
valores mais nobres, certamente lhe será dado um desconto. É como uma criança que
comete uma travessura a
primeira vez. Os pais sensatos e prudentes, devem
dar um desconto, afinal, ela- a criança- não tinha como saber que o que fez era uma
travessura perigosa , arriscada ou danosa. Agora, depois que ela foi ensinada e
lhe foi mostrado que ela não pode, por
exemplo, derramar o xampu, ou jogar água no papel higiênico, ou botar o dedo na
tomada... Se depois de conhecer o que é certo, ela escolher fazer o errado- aí
sim, é possível e justo cobrar e punir. O tipo de punição deve levar em conta
sempre a gravidade da travessura e o lado pedagógico- do contrário- não fará
sentido.
Ou seja, só posso cobrar de quem tem
o conhecimento do certo e do errado. E quanto maior for esse conhecimento,
maior a responsabilidade, e, portanto, a "cobrança" . Sei disso com
propriedade pois tenho uma filha de três anos e uso desse critério pra decidir se
a travessura é passível de punição ou não. Me questiono: ela sabia o que estava
fazendo? Tinha consciência do erro? Eu já havia mostrado e ensinado a ela que
este ou aquele comportamento era “errado”? Só então é possível avaliar se é
cabível ou não uma “punição” com valor pedagógico ou educativo- ou não. E se
sim, o tipo e a extensão dessa punição. Algumas pessoas defendem a palmada,
outras não. Eu acho que a palmada só em casos extremos, quando, por exemplo, a
criança tem a mania de querer meter o dedo na tomada. É melhor uma palmada, não
acha?
Por outro lado, aqueles que tem o conhecimento
da verdade, e que de alguma forma tiveram acesso a esse conhecimento, seja
através de leituras, pelas orientações dos mestres e familiares, pela sabedoria adquirida ao longo da vida, pelas
experiências, pelo autoconhecimento, pela Meditação etc. - esses tem uma
responsabilidade muito maior diante do trono de sua própria consciência. Estes, certamente, serão devidamente cobrados, na medida de seus conhecimentos.
"A quem mais foi dado, mais será
exigido"- não por um Deus cruel e soberano que fica em seu trono esperando
maquiavelicamente a hora de julgar e punir, mas pela sua própria consciência expandida
pelo acesso a conhecimentos cada vez mais profundos e valiosos. Quem começa a
trilhar o caminho da meditação e do autoconhecimento não pode esquecer que conhecer é poder. E que,
quanto maior for o poder, maior será a responsabilidade e a cobrança.
Namastê!
Alsibar
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